domingo, 27 de maio de 2012

Procura da Poesia

Este foi o semestre do Modernismo (e, por que não dizer, de Drummond?) na minha vida;  para fechar a graduação com "chave de ouro"! Além dos trabalhos sobre a Procura da Poesia e da Máquina do Mundo, em Literatura Brasileira III, analisei Oficina Irritada em Teoria da Literatura. Drummond é o cara!! 
Eis mais um trabalhinho que eu fiz (para colaborar com a literatura na internet, que está tão abarrotada de porcarias)...

E se você é aluno de Letras e está aqui só para dar Ctrl C+ Ctrl V, lembre-se que, além de ser feio (e um atestado de incompetência), plágio é crime. Caso utilize meu trabalho, não esqueça de usar aspas e referenciar no final, pois trabalho intelectual também é trabalho e ninguém gosta de ser roubado.  Agora, se você for um incompetente, troque de curso, o Brasil agradece... precisamos melhorar a educação do país e com acadêmicos "assim" fica difícil, né?

Ok, feito o desabafo, sugiro que só leia o trabalho se estiver bem intencionado.


Mais do que uma "receita" para se fazer um bom poema, a Procura da poesia é uma poema metalinguístico (ou seja, a linguagem falando da linguagem). O eu-lírico traz à tona a velha e sempre presente polêmica acerca do que é, afinal, poesia. E um tom um tanto nevrálgico, tem-se aqui uma maravilhosa e arrebatadora crítica aos pseudo-poetas, que acreditam, enganadamente, estar fazendo poesia a partir de suas próprias vivências, experiências e sentimentos.
Na primeira e na segunda estrofe, o eu-lírico coloca:
Não faças versos sobre acontecimentos.
Não há criação nem morte perante a poesia.
Diante dela, a vida é um sol estático,
não aquece nem ilumina.
As afinidades, os aniversários, os incidentes pessoais não contam.
Não faças poesia com o corpo,
esse excelente, completo e confortável corpo, tão infenso à efusão lírica.
Tua gota de bile, tua careta de gozo ou de dor no escuro
são indiferentes.
Nem me reveles teus sentimentos,
que se prevalecem do equívoco e tentam a longa viagem.
O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia.

A vida, os acontecimentos, nada disso deve ser fonte de inspiração ao verdadeiro poeta, portanto, aquele que quiser se tornar um bom poeta deve ignorar o que viveu, o que sentiu, suas alegrias, frustrações, pessoas que conheceu, pois a poesia não deve ser feita com o corpo ou baseada em vivências, e sim com a alma (baseada em palavras).             Aqui o eu-lírico encontrou uma maneira "gentil" de dizer que o que a pessoa sente não lhe interessa, os sentimentos devem ser guardados, pois isso nunca será poesia.
Não cantes tua cidade, deixa-a em paz.
O canto não é o movimento das máquinas nem o segredo das casas.
Não é música ouvida de passagem, rumor do mar nas ruas junto à linha de espuma.
O canto não é a natureza
nem os homens em sociedade.
Para ele, chuva e noite, fadiga e esperança nada significam.
A poesia (não tires poesia das coisas)
elide sujeito e objeto.
           
            O lugar onde o poeta mora também não deve ser fonte de sua inspiração, as coisas que acontecem nas cidades ou na intimidade dos lares, isso não é poesia e, portanto, não é música. A natureza, o modo como o qual os homens se organizaram socialmente não devem aparecer nos versos, pois para o canto "chuva e noite, fadiga e esperança" não significam nada, pois a poesia suprime sujeito e objeto. A frase no imperativo negativo faz um apelo aos poetas ou que assim denominam-se: "não tires poesia das coisas".
Não dramatizes, não invoques,
não indagues. Não percas tempo em mentir.
Não te aborreças.
Teu iate de marfim, teu sapato de diamante,
vossas mazurcas e abusões, vossos esqueletos de família
desaparecem na curva do tempo, é algo imprestável.
           
            Os males que porventura acometem o ser humano, suas ilusões, suas dúvidas, seus pertences, até suas mentiras, tudo desaparece "na curva do tempo" e, como sabemos, a boa poesia é imortal, resiste ao tempo. A que não resiste não presta.
Não recomponhas
tua sepultada e merencória infância.
Não osciles entre o espelho e a
memória em dissipação.
Que se dissipou, não era poesia.
Que se partiu, cristal não era.
           
            O ato de colocar em versos a lembrança do que já passou não os transformam em poesia, pois isso se dissolveu no tempo, e a verdadeira poesia não se dissolve, não se quebra (o que se quebra não tinha o valor que é atribuído ao cristal).
Penetra surdamente no reino das palavras.
Lá estão os poemas que esperam ser escritos.
Estão paralisados, mas não há desespero,
há calma e frescura na superfície intata.
Ei-los sós e mudos, em estado de dicionário.
Convive com teus poemas, antes de escrevê-los.
Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam.
Espera que cada um se realize e consume
com seu poder de palavra
e seu poder de silêncio.
Não forces o poema a desprender-se do limbo.
Não colhas no chão o poema que se perdeu.
Não adules o poema. Aceita-o
como ele aceitará sua forma definitiva e concentrada
no espaço.

            Até aqui o eu-lírico vinha dizendo tudo o que não deveria ser feito ao se compor uma poesia e partir daqui ele começa a dizer como ela deve ser construída. Para ele, a verdadeira e valiosa poesia, aquele que resiste ao tempo e às mudanças, é feita simplesmente de palavras, pois é no "reino das palavras" que residem os poemas que estão aguardando pelos poetas por vocação. Um bom poema nunca é feito com pressa, eles estão "paralisados, mas calmos", portanto, fica a dica ao poeta: não te apresses.
            A boa poesia não surge pelo desespero, ela permanece imóvel e muda e só fala por si quando a intimidade do poeta com as palavras surgir naturalmente, por isso o conselho: "Convive com teus poemas, antes de escrevê-los. / Tem paciência se obscuros. Calma, se te provocam", pois cada verso e cada poema têm seu tempo certo. A poesia não é uma arte para os afobados ou embebidos pela paixão carnal. "Não forces o poema a desprender-se do limpo./ Não colhas no chão o poema que se perdeu", quer dizer, não faça de tudo para conseguir escrever qualquer coisa, não tente reconstruir um poema que não de certo, a verdadeira poesia flui naturalmente.
Chega mais perto e contempla as palavras.
Cada uma
tem mil faces secretas sob a face neutra
e te pergunta, sem interesse pela resposta,
pobre ou terrível, que lhe deres:
Trouxeste a chave?
Repara:
ermas de melodia e conceito
elas se refugiaram na noite, as palavras.
Ainda úmidas e impregnadas de sono,
rolam num rio difícil e se transformam em desprezo.
           
            A "chave" para encontrar a boa poesia é apaixonar-se pelas palavras, pois cada uma delas, por mais neutra que possa parecer, tem outras mil faces secretas e são as palavras que perguntarão ao poeta se este possui "a chave", que nada mais é do que o segredo para usá-las adequadamente e compor os versos imortais pelos quais elas tanto esperam.
            As palavras não possuem melodia, nem opinião, "elas se refugiaram na noite [...] rolam num rio difícil e se transformam em desprezo". Isso pode significar duas coisas: as palavras estão esquecidas, abandonadas em um lugar de onde é difícil tirá-las e do qual não conseguem sair por si próprias, elas desprezam os sentimentos dos poetas medíocres, mas elas também são desprezadas por estes (justamente por serem medíocres). Só o verdadeiro poeta é capaz de resgatar as palavras certas desse rio revoltoso.

REFERÊNCIA


ANDRADE, C. D. de. Procura da poesia. Disponível em:
com.br/drummond/poema025.htm>. Acesso em: 08 abr. 2012.


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